Conversando com a Morte

Qual é a sensação de levar uma alma?
Eu sou responsável pelo direcionamento das almas que agora vivem em um lugar nunca visto. O ato de morrer está nas mãos de quem vive. A pessoa morre pelo destino ou pelo próprio querer, voluntária ou involuntariamente.

Não entendi o ato de morrer...
A vida é uma dádiva. As pessoas à têm para o seu próprio “consumo”. Sabe-se que um dia, a passagem dada vida para morte se fará inevitável, porém tal passagem se adianta quando a vida não é cuidada. Tenha a vida como uma flor, regue-a, cheire-a, beije-a, dê de tudo para que fique cada vez mais bela e saudável, e ela lhe retribuirá com mais tempo de sua beleza. Mas esqueça dela e comece a plantar ao seu redor uma planta parasita. A flor se negará a abrir e antecipará o seu fim. É isso que se deve ser feito. Cuidar da vida e não se preocupar com a morte, pois é a única coisa certa que terás.

Como é que as pessoas lhe vêem?
Para muitos, ou talvez para todos, sou um esqueleto encapuzado, vestido de preto que verão no fim da vida. Sou a criatura do medo e por isso relacionam-me à coisas que até mesmo eu odeio. Mas por que isso? Porque sou a primeira coisa que a alma vê após a passagem, a anunciação do fim da vida. Ninguém vê que eu sou o inicio. Eu é que lhe guio pelo desconhecido. Não possuo forma fixa, pois sou abstrato e cada um me interpreta e me vê de um jeito.

Como se recuperar de um ente que fez “a passagem”?
A vida não é feita só de alegrias e com certeza no ultimo respirar de um ser ele lembra-se de todo o seu sofrimento e da sua ascensão para a felicidade. Conto-lhe uma história: “um certo dia, uma moça aos prantos me procurou para saber porque tinha levado o seu amor. Apesar do sofrimento de estar preso a uma cama inconsciente ela mantinha viva a esperança do retorno. Mais após a sua morte tudo se foi e só ficou a sua tristeza. Então lhe disse: feche os olhos e imagine o escuro. O completo escuro. Há uma criatura nesse escuro, aturdida a procura de uma saída. No meio da escuridão abre-se uma porta cintilante, cravejada a ouro e brilhantes, e na sua passagem há uma luz incandescente, ofuscante, branca como a paz. Enfim, essa criatura atravessa a porta que é fechada à espera de novas criaturas que procuram a luz. Seu amor atravessou a porta. O escuro era a sua vegetação e a luz a sua salvação.. ele não se foi, só vive em outro plano agora. Lembre-se dos momentos bons pois hoje dói mais no futuro o bom é a saudade.”. Aconselho a todos essa metáfora.

O ultimo respirar, o ultimo batimento cardíaco, a hora da passagem é para muitos a maior dor que terão na sua vida mas, morrer dói?
Nunca fui viva para saber a dor da passagem. Mais sei que o sofrimento que se têm é passageiro e ridiculamente instantâneo. A sua vida é tracejada por uma linha grossa e aparentemente difícil de partir. A cada ato bom, um nó se aparece, a tornando mais forte. A cada ato ruim uma “fenda” se abre. A morte é o corte dessa corda. É rápido e indolor por isso chega a ser ridículo. Se você sofre do uma doença degenerativa, vai doer até o ultimo suspiro. Mais após os rápidos e incríveis míseros milésimos da passagem, o seu corpo de “desliga” da sua alma e a dor se vai. Sei disso por que ouso os relatos dos mortos. Viver dói, morrer não.

Como é o outro lado?
Há coisas restritas até para “os funcionários”. Como já disse, sou apenas a guia e por isso não posso ter passatempos. Pessoas morrem a cada segundo, deixando-as na escuridão, arcarei as conseqüências do meu erro. Só posso lhe dizer uma coisa, a descrição que se tem do além na terra é sem nexo. O segundo plano é abstrato. A luz branca da passagem é a paz. Cada um tem a paz que merece então cada um tem um além diferenciado.

Como é a sua relação com a vida?
Pode ser engraçado mais tenho uma intimidade muito grande com a vida. Ela quem me leva aos perdidos. Sem ela não haveria ordem. Gosto da vida mas tenho pena dela. Apesar de ser mais, e muito mais, vangloriada que eu, não tem o valor merecido e com isso é esquecida. Ironicamente só volta a ser lembrada com valor quanto está preste à vim ao meu encontro. É triste a vida da vida.

Se fosse vivo(a), o que mais teria prazer em fazer?
Teria o prazer de cuidar bem da minha vida, para atrasar o encontro com a morte.

Poderia como desfecho, falar algo para os leitores?
Sim. O que há em mim não é ruindade ou desprezo pelos vivos. Não sou ícone do fim. Não sou símbolo do mal. Não sou a ultima coisa vista. Sou sim o início, o novo bem e a primeira a ser vista. Sou a anunciação da nova vida. Da sua transformação espiritual. Você me vê como quer me ver. Se a paz é uma pomba porque não posso ser um falcão? Ou um esquilo? Não quero que tenham medo de mim. Quero que saibam que quando me encontrarem serei a única a lhe ajudar. Mais se mesmo assim ainda tiverem medo de mim lembrem-se de cuidar bem de suas vidas para adiar nosso encontro, pois uma coisa é certa, um dia, você virá ao meu encontro. Querendo ou não. Obrigado(a)
Morte

Por Matheus Assis ( @santo_potter)

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